Santiago (EFE).- O presidente do Chile, Gabriel Boric, disse que a Lei Antiterrorista “não é um instrumento jurídico adequado” para enfrentar as situações de violência que ocorrem em La Araucanía, epicentro do conflito entre o Estado e o povo mapuche, visitado pelo mandatário nesta quinta-feira pela primeira vez em seu mandato.
“Na região [de La Araucanía] houve atos de natureza terrorista (…), mas o problema é que a pressão imediata é a aplicação da Lei Antiterrorista, que trouxe resultados terríveis para as vítimas e para o Estado”, afirmou.
O presidente se referiu aos ataques ocorridos na região, no sul do país, horas antes de sua chegada – escola e capela foram queimados, além do fechamento da estrada principal –, qualificou os responsáveis como “covardes” e assegurou que “vamos persegui-los com todo o peso da lei”.
Segundo o presidente, trata-se de “grupos criminosos que utilizam causas legítimas para cometer crimes, causar medo, dano e morte”.
“Eles me lembram quando na década de 1930 os nazistas queimavam sinagogas ou quando a ditadura militar queimava livros na praça San Borja (…) A grande maioria do povo mapuche quer a paz e vamos dialogar com eles”, acrescentou.
Boric também anunciou uma série de medidas em termos de segurança, melhorias sociais e para favorecer o diálogo político em La Araucanía que formará uma lei específica para a área “para que transcenda” seu mandato.
“Temos interesse que seja uma política de Estado, não me interessa que seja identificado com meu nome particular”, anunciou o presidente, que convidou governadores, parlamentares, prefeitos e atores da região a participar da elaboração da lei.
Boric lembrou que o conflito entre o Estado e o povo mapuche tem sido abordado por diferentes governos e que “embora tenham sido feitos esforços”, continua sem solução até hoje.
“A única maneira de deter a escalada da violência é reparar a dívida histórica que o Estado chileno tem com o povo mapuche”, disse.
O Estado chileno abandonou La Araucanía
Sua primeira atividade em La Araucanía foi um encontro com o governador da região, Luciano Rivas, do qual também participaram os ministros da Secretaria-Geral da Presidência (Segrpes), Ana Lya Uriarte; do Interior, Carolina Tohá; e Obras Públicas, Juan Carlos García, que o acompanham em sua viagem.
Mais tarde, Boric liderou uma reunião do gabinete regional, onde argumentou perante os representantes do governo na região que “é uma região que, em certos setores, o Estado abandonou e temos de perceber que o Estado vai estar presente novamente, que vamos recuperar o território, a tranquilidade, a paz para o nosso país”.
“Isso não é apenas do ponto de vista da ordem pública, embora seja a principal preocupação, é também no investimento em segurança, em infraestrutura, em saúde, em educação; é algo que sempre fica muito, muito para trás, como a cultura e o esporte”, acrescentou.
O presidente ficará até amanhã, em viagem anunciada e esperada há semanas.
Em La Araucanía e outras regiões do sul do Chile, o chamado “conflito Mapuche” dura há décadas, colocando comunidades indígenas contra empresas agrícolas e florestais que exploram terras consideradas ancestrais.
O povo Mapuche, o maior grupo étnico indígena do Chile, reivindica as terras que habitaram por séculos, antes de serem ocupadas à força pelo Estado chileno no final do século XIX em um processo oficialmente conhecido como “Pacificação de La Araucanía” e que hoje pertencem maioritariamente a empresas florestais de grupos econômicos poderosos.
Nesse contexto, os ataques incendiários a máquinas e propriedades são frequentes e o conflito tem custado a vida de um grande número de membros da comunidade mapuche nas mãos de agentes do Estado, registrando também a morte de policiais e greves de fome de presos indígenas. EFE