María Luisa Villareal durante uma entrevista à EFE em Bacalar. EFE/ José Méndez

Trem Maia traz “turistificação” e desloca comunidades no sudeste do México

Cristina Sánchez Reyes

Bacalar (México) (EFE) – O Trem Maia, projeto emblemático do presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, criou um dilema para as comunidades do sudeste do país, que têm que enfrentar consequências como a “turistificação” e a necessidade de deslocamento para abrir espaço para o trem, que tem como objetivo trazer desenvolvimento para a região.

Na cidade de Bacalar, em Quintana Roo, conhecida por sua bela lagoa multicolorida, está sendo construído o trecho 6 do Trem Maia, que terá quase 256 quilômetros de extensão e ligará essa cidade a Tulum, no Caribe mexicano.

“Ele foi apresentado como um projeto de justiça social, ou seja, no qual a justiça será feita às comunidades, que poderão aproveitar os benefícios do desenvolvimento, mas tudo isso tem um custo”, disse em entrevista à Agência EFE a conselheira comunitária e moradora de Bacalar, María Luisa Villarreal.

Esse custo, segundo a presidente do Grupo Ecologista Mayab (Gema), Aracely Domínguez, implica em mudanças no estilo de vida das comunidades, bem como na falta de transparência na assinatura de acordos, na ocupação de terras e no fato de as autoridades não pagarem o preço justo pelas desapropriações.

O Trem Maia é um projeto de mais de 1.500 quilômetros de trilhos ferroviários para transporte de carga, turistas e passageiros locais nos cinco estados do sudeste do país: Campeche, Chiapas, Quintana Roo, Tabasco e Yucatán.

“A maioria das comunidades não quer esse tipo de desenvolvimento, não quer mais hotéis, shoppings e loteamentos em suas áreas. Mais de 2.700 hectares foram desapropriados, principalmente de ejidos (propriedade rural de uso coletivo), e em alguns casos há reclamações de que eles não foram pagos, não receberam o suficiente e de que promessas não foram cumpridas”, alertou Domínguez.

López Obrador, no entanto, insiste em que o Trem Maia, que deverá ser parcialmente inaugurado em 15 de dezembro, é o projeto que trará prosperidade a uma das áreas historicamente mais negligenciadas do país.

Aumento do custo de vida

Os mais de 41 mil habitantes de Bacalar, cidade situada em uma bela região rural, têm uma visão um pouco mais complexa do assunto.

Eles reconhecem que tiveram um crescimento exponencial no número de visitantes na última década, mas alegam que a chegada desse megaprojeto não trouxe apenas a promessa de progresso, mas também problemas consideráveis.

Um dos principais é a moradia: a maioria dos habitantes tem problemas para encontrar um lugar para viver, já que a maioria das construções é destinada a turistas, o que elevou os preços e tornou grande parte dos imóveis inacessível para os moradores locais.

“Viver em Bacalar é muito caro. Um quarto alugado, por exemplo, custa o mesmo que uma casa completa em Chetumal (a capital do estado). Onde os habitantes locais vão morar?”, questionou Villareal.

Desmatamento e falta de planejamento

A população local também está preocupada com o fato de que a pressa em concluir esse projeto impediu o planejamento adequado do deslocamento da população local, que já tinha problemas anteriores de acesso à saúde, serviços e infraestrutura, entre outros.

Além disso, outro efeito negativo foi o desmatamento de cerca de 200 mil hectares que ajudavam a mitigar as inundações na área, já que, as águas das chuvas que caem em outras partes, como no estado vizinho de Campeche, fluem para Bacalar.

“Somos a parte baixa, somos uma área de pântanos conectados e eles não estão levando isso em conta (na construção do projeto)”, acrescentou Villareal.

Diante disso, os habitantes estão trabalhando arduamente para criar leis comunitárias, já que Bacalar ainda não tem regulamentos ou programas de desenvolvimento urbano.

“Enquanto não tivermos esses instrumentos, continuaremos sendo terra de ninguém e as decisões ficarão a critério das autoridades locais”, concluiu Villarreal. EFE

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